A bandeira levantada pelo deputado federal José Mentor (PT-SP), que defende a proibição da exibição do MMA pelas TVs brasileiras, ganhou nesta quinta-feira um opositor de peso. O senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) publicou em sua conta no Facebook um texto defendendo não só a exibição do MMA, como a sua prática de forma responsável e regulamentada. Diplomata, cientista social, o senador é também faixa-preta de jiu-jitsu e apreciador de artes marciais, e defende que o MMA não é mais violento que o rúgbi ou que o polo aquático.
Confira a íntegra do texto publicado por Arthur Virgílio:
"O deputado federal José Mentor, do PT paulista, erra redondamente ao insistir na tentativa de proibição de televisionamento dos eventos de Mixed Marcial Arts. Nenhum dos seus argumentos se sustenta. Fala de assunto do qual não entende e o faz com a pose típica dos que falam desenvoltamente sobre temas cujos fundamentos lhes escapam ao conhecimento.
O relator do seu projeto, na Câmara, foi ou é o deputado Fabio Farias, do PSD do Rio Grande do Norte. Cauteloso, talvez até por ser um esportista, não necessariamente das artes marciais, promoveu movimentadas e valiosas sessões de audiência pública, ouvindo os dois lados da questão. Numa dessas ocasiões, tive a honra de ser um dos debatedores, ao lado do querido amigo e conterrâneo Wallid Ismail e do mestre de Muay Thai, Arthur Mariano, que também é excelente comentarista de MMA do Canal Combate.
Ponderamos ao deputado Mentor e aos demais presentes que os praticantes de MMA são, pelo preparo, pela estrutura física básica (não é qualquer um que pode aventurar-se num ringue ou num octógono, mesmo dispondo de conhecimentos técnicos) pessoas diferentes das que levam uma vida "normal", sedentárias ou mesmo praticando atividade física moderada. Enfatizamos: "deputado: o queixo deles é diferente do seu, por exemplo. Os punhos, as pernas, o abdômen também. E eles enfrentam adversários do mesmo calibre, cercados de assistência médica eficaz, protegidos pela vigilância de um juiz altamente profissional, submetidos a regras e limitações que visam a resguardar a saúde dos atletas".
E há o aspecto profissional: os atletas, pela via do MMA, têm real possibilidade de ascensão social. Os grandes eventos são milionários. No Brasil eles vêm crescendo significativamente, garantindo empregos para preparadores físicos, para professores das várias modalidades de luta que os artistas marciais precisam conhecer, para psicólogos (há, hoje, psicólogos especializados em trabalhar a cabeça dos lutadores), para nutricionistas, para os cut men (os especialistas em estancar sangramentos), os que carregam o balde e os bancos, para assessores de imprensa, para publicitários, para agentes de turismo, para o setor hoteleiro, para taxistas, para restaurantes, enfim, para uma infinidade de pessoas e ramos de negócio que fazem parte do universo das MMA. Os EUA ganham bilhões com esse esporte que, lá, só perde em pay per view para o futebol americano. Por que deveríamos deixar de fazer o mesmo no Brasil?
O esporte é duro, inegavelmente. Seria mesmo mais violento do que o próprio futebol? Com certeza é menos violento que o Rugby que, por sinal, considero um jogo bonito e eletrizante. E é leal, cavalheiresco, diferentemente, por exemplo, do Pólo Aquático, que se as águas falassem relatariam as barbaridades que os seus praticantes aprontam com seus oponentes; o juiz só vê o que se passa em cima, não vê nada do que se passa sob as águas.
A argumentação do deputado paulista, repito, é falha e sem densidade. Ele sequer fala em proibir o esporte. Limita-se a propor o não-televisionamento. Ora, ele, então, é contra a "violência" ou apenas não quer que as pessoas de casa a vejam? Onde sua preocupação com a integridade física dos atletas, que continuariam lutando, só que sem a visibilidade que a televisão proporciona? Só isso já bastaria para desacreditar o projeto de lei.
Mentor compara o MMA às brigas de galo, de cães, de canários. Compara homens dotados de pleno tirocínio e vontade própria a animais que são obrigados a se matar em rinhas, para dar lucro às pessoas que os exploram. Ele nunca conversou com um Murilo Bustamante, figura culta, elegante, que foi campeão mundial meio pesado no UFC e hoje é empresário (de luta) de sucesso. Nunca falou com o campeoníssimo Anderson Silva, que sabe proteger sua saúde como ninguém. Nunca falou com um Wanderlei Silva, que fez a independência econômica de sua família dentro dos ringues e dos octógonos, onde brilha até hoje. Não sabe que o UFC foi vendido por Rórion Gracie aos irmãos Fertitta por US$ 2 milhões e, hoje, vale mais de US$ 2 bilhões (90% do empreendimento pertencem aos Fertitta e 10% a Dana White) e que os impostos recolhidos por empresas desse porte constroem hospitais, estradas, escolas, são investidos em experiências médico-científicas para curar doenças, etc.
O deputado certamente pensa que, sem televisão, o MMA terminaria morrendo de inanição. Também acredito que sim. Mas o que ele ignora é que proliferariam pelo país deploráveis clubes de luta, sem regras, sem assistência médica, sem recolhimento de impostos, sem garantia nenhuma aos atletas. Hoje mesmo, existem alguns, que as polícias deveriam localizar e fechar.
Quando digo que o deputado resolveu legislar sobre tema que desconhece por inteiro, pensei muito nesses lamentáveis clubes de luta, que são rinhas de sadismo e exploração dos lutadores que para eles são conduzidos. Wanderlei Silva disse com muita propriedade: "deputado, se o senhor não gosta de nos ver lutar, troque de canal, vá ver um filme ou outro programa qualquer. Evite, porém, interferir num esporte que vai bem no Brasil e poderia ir melhor se lhe déssemos a mesma importância que os EUA lhe conferem". Eu me arriscaria a completar: "a lei seca só fez alimentar o gangsterismo nos Estados Unidos. A clandestinização das MMA desempregaria muita gente e somente serviria para os donos e apostadores dos clubes de luta".
Os mais antigos costumavam dizer: 'às vezes, a palavra é de prata; às vezes, o silêncio é de ouro'. O deputado Mentor ganharia muito se ficasse calado quando se tratasse de mecânica quântica, energia nuclear e, sem dúvida, Mixed Martial Arts. Sem ironia nenhuma de minha parte".
Fonte: SporTV.com